Leitura Bíblica: Filemom 1:17-19
Versículos-chave: “Portanto, se me considera seu companheiro na fé, receba-o como receberia a mim. Se ele o prejudicou de alguma forma ou se lhe deve algo, cobre de mim.” (Filemom 1:17-18 NVT)
A resposta de Filemom à carta de Paulo não foi registrada nas Escrituras, mas algumas fontes históricas sugerem que ele acolheu Onésimo como um irmão em Cristo e que, posteriormente, este veio a se tornar um líder na igreja. Este é o impacto transformador do Evangelho: ele subverte os valores do mundo, restaura o que foi quebrado e chama os que foram rejeitados a se tornarem instrumentos da glória de Deus. Afinal, a carta a Filemom não trata apenas de um escravo e de seu senhor – ela fala sobre todos nós. Fala, sobretudo, de um Deus que nos convoca ao perdão quando preferiríamos nos apegar à ofensa, e de um Salvador que toma sobre Si as nossas dívidas, oferecendo-se em nosso lugar.
A carta a Filemom representa uma confrontação corajosa às estruturas sociais profundamente enraizadas de seu tempo. A escravidão não era simplesmente aceita, mas sustentava a economia, as leis e o modo de vida romano. Ela não se baseava em critérios étnicos, mas resultava de guerras, dívidas ou do nascimento. Assim, os escravos provinham de origens variadas: prisioneiros de guerra, filhos de famílias humildes, pessoas vendidas ou aquelas que se entregavam à servidão para não perecerem de fome. Eram, portanto, vistos como propriedade, sem direitos civis ou liberdade pessoal; e a legislação romana era clara: o escravo não possuía existência própria fora da vontade de seu senhor.
É nesse contexto que surge o apóstolo Paulo – idoso e encarcerado – escrevendo a Filemom e pedindo que ele renunciasse a tudo o que aprendera sobre posse e justiça, a fim de enxergar Onésimo não sob a ótica do mundo, mas sob a perspectiva de Cristo. O objetivo de Paulo não era atacar a escravidão diretamente, mas minar seus fundamentos ao redefinir a relação entre senhor e servo, tornando impossível a qualquer cristão genuíno continuar tratando outro ser humano como um bem material.
“Portanto, se me considera seu companheiro na fé, receba-o como receberia a mim. Se ele o prejudicou de alguma forma ou se lhe deve algo, cobre de mim.” (Filemom 1:17-18 NVT)
Esse não é um simples pedido, mas uma intercessão em seu grau mais elevado: um homem comum se colocando entre dois outros, assumindo o papel de mediador – não apenas para apelar a Filemom em favor de Onésimo, mas para tomar para si o preço da reconciliação. No mundo antigo, o mediador exercia uma função nobre e arriscada: ele se comprometia com o destino do outro, colocando-se em seu lugar e tornando possível o que, sem intervenção, seria inalcançável – a restauração.
Paulo não apenas clama pelo perdão de Onésimo; ele se oferece para quitar qualquer dívida, material ou moral – “Eu, Paulo, escrevo de próprio punho: Eu pagarei” (Filemom 1:19 NVT). Essa atitude nos conduz à reflexão:
Quem são os “Onésimos” em nossa caminhada? Quem é a pessoa que Deus está nos chamando para amar – não como o mundo ama, mas como Cristo nos amou? Teremos coragem de dizer, como Paulo, “coloque na minha conta, e eu pagarei”?
Portanto, a carta a Filemom não fala apenas de um escravo e de seu senhor, fala de cada um de nós. É um convite a escolher o amor quando o coração clama por justiça própria, a perdoar quando tudo parece perdido e a buscar reconciliação onde o mundo só enxerga divisão.
“Não devam nada a ninguém, a não ser o amor de uns pelos outros. Quem ama seu próximo cumpre os requisitos da lei de Deus.” (Romanos 13:8 NVT)




